sexta-feira, 7 de agosto de 2009

A Loja das Memórias

Minhas lembranças de infância, adolescência e vida adulta, fatalmente passam pelas Americanas. Eu me lembro de ter vindo passear em Ribeirão, com oito anos de idade, ainda morava em Tambaú, ter visto uma bola na loja, ter ficado bravo com meu pai porque ele não adivinhou que eu queria a bola e ter fugido da família e me perdido na imensa metrópolis que visitava. Deu polícia e tudo, mas acabei me achando e voltando para a pensão em que meus pais estavam. Depois, já morando aqui, um dos meus melhores aniversários foi um em que a Vera, amiga da família, me levou até as lojas e disse que eu poderia escolher o que quisesse para comer. Escolhi um cheese burger, uma banana split e uma coca-cola. Impossível esquecer os papeizinhos enrolados e espetados no abacaxi de isopor e guache que davam descontos de até 100% no hula-hula. Impossível esquecer o frio do sorvete morango-chocolate-creme-flocos-coco misturado ao não-tão frio chantilly e à surpresa de textura e temperatura do cubinho de gelatina vermelha que adornava a taça escolhida. Só lá, naquela época, tinha essas delícias geladas. Só lá tinha o L.A.S.A., sanduíche feito no pão de forma, cortado em quatro triângulos eqüiláteros e montados em pé, como uma pirâmide asteca rodeada por batatas chips. Lembro de, na adolescência, tentar furtar alguma coisa, uma bala, para ver se escapava vivo dessa grande aventura das histórias propagadas aos quatro cantos de um banheiro (ou salinha) escuro onde adôlas abusados podiam ser torturados por seguranças implacáveis que tinham em si refletido o regime totalitário que rolava nas ruas da época.
Em 1989, também me lembro muito bem, comecei a alimentar minha vasta coleção de cds, com as ofertas das Americanas. Naqueles tempos, o mercado não estava tão pasteurizado e você podia encontrar pequenos tesouros musicais por lá. Um duplo do Fred Astaire, acompanhado de um trio clássico piano-baixo-bateria de jazz. O Sandinista do The Clash, a trilha do Manhattan do Woody Allen, que eu vi, mas perdi. Posso dizer que, pelo menos uns sessenta por cento dos meus pra lá de mil cds, vieram de lá. Eu freqüentava tanto as lojas, nesse período, que era amigo dos vendedores e vendedoras da seção de cds. Acompanho até hoje a trajetória de alguns por outras lojas. Tinha a Creusa, gerente da seção que me avisava quando ia ter promoção. O Eduardo, que foi parar na C&C. Uma vez me chamaram para conversar para que eu fosse o “cliente X”, fiquei orgulhoso do convite. Minha missão era comprar na loja e avaliar, secretamente, o atendimento. Até tentei, mas desisti, e entreguei o cargo, já que me sentia traindo os amiguinhos vendedores. Foi lá que eu andei de escada rolante pela primeira vez. Era lá que tinha o hot-dog com o melhor molho de cebola, tomate e pimentão de Ribeirão.
Foi de lá, também, que veio grande parte dos bonequinhos de filmes e desenhos animados de minha outra coleção. E é lá que, sempre que vou ao centro, dou uma passadinha. Nem se for só para lembrar de tudo que me fez feliz, lá.
Texto de Cleido Vasconcelos publicado no Guia Centro de Ribeirão - Edição Março 07

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