terça-feira, 4 de agosto de 2009

O que Foi, É

Suba que o preço desce. Lá ia o Amigo da Onça, galgando a escada. Descia, com uma bolsa de dinheiro na mão. Em néon. Na vitrine, cerejas, figos, damasco, pêssegos, maravilhas da Grécia, da Turqueia e doces árabes – tudo o que o menino pobre engolia com os olhos e nunca comeu. O sabor, no entanto, adoça-me a lembrança, e hoje, nenhuma fruta exótica se iguala aquelas nunca provadas da Chapelaria Olympica.
Depois de salivar na vitrine da Olympica, subia a General Osório. Parava na esquina do Lanches Paulista para olhar os ricos, qtenha existido. Então, vislumbra outras delícias, naquela bomboneria do PEdroII, que tinha os menininhos beijoqueiros. Mas ali não parava, mal via o Alfredo Engraxate lustrando os sapatos do Osvaldo de Abreu Sampaio, o Careca, dono dos cinemas, eterno candidato a prefeito, ou o doutor Luisinho Gomes de Matos, para chegar ao meu destino – o Pirata.
Esquecia-me até de conferir o cartaz do Flash Gordon, anunciando a aventura insuperável da manhã domingueira. Queria ver o Pirata da Perna de Pau, da Tabacaria Sampaio. Que carinha sacana! As bochechas rosadas, lenço no pescoço, camisa quadriculada, como um caubói fora do lugar, na boca um sorriso eterno, parecido ao Mad, um furinho entre os lábios, para se encaixar o cigarro. A cabeça balangava de um lado para outro.
Meu Deus! Quando o velho Sampaio estava de bom humor punha um cigarro acesso na boca do Pirata. E sei lá como, ele tragava! E soltava a fumaça que embaçava a vitrine. De repente, alguém encostado em mim. Era outro garoto, fascinado como todos, vendo o Pirata balangar a cabeça, soltar fumaça. O velho Sampaio nos dava uma bala.
Essa é a cidade que foi. Onde andará o Pirata? Ao desativar tabacaria o velho Sampaio o guardou? Ou o pirata desapareceu como os sonhos dessa cidade que já não é?
Texto de Júlio José Chiavenato publicado no Guia Centro de Ribeirão - Edição Março 07

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