quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Um Olhar Paulistano Sob o Céu de Ribe

Para esta paulistana, aqui chegada há 12 anos, Ribeirão tem gosto de céu: céu de sol, céu de estrelas. É que acostumada a viver na grande cidade, movida a concreto e paredes, contente apenas com nesgas de céu, obliterado pela fumaça, era de se esperar que a imensidão e o espaço acima de minha cabeça, causassem maravilhas.
E eu vinha menina para as férias. Ficava na casa de tios bem mais velhos, um mar de sabedoria, lá na rua Prudente de Moraes. E eram os passeios de manhã, o sol habitando a pele, e o céu azul de doer, com suas nuvenzinhas cheias de arabescos. O tio a contar estórias, mentiroso, dessa mentira boa a serviço do fascínio. Eu, e meu narizinho pra cima, sempre a contemplar o colorido. E era a Padaria na Sete de Setembro e seu pão aromático e nós dois sentados tio e sobrinha, na praça. À noite eram as estrelas, eu olhando da janela, sentindo, mais do que pensando, a presença de alguém muito superior, que pintava estrelas lá em cima e que trazia a lua, sabe-se lá de onde. E era a feira da Avenida Independência, o feirante a me dizer: menina bonita não paga. E o arremate: também não leva. E o gostoso de comer pêssego sem ser lavado, só esfregado, mal e porcamente, na saia modesta de panos, e lá em cima as nuvens a correr e o azul escancarado a me fitar.
E era adolescente, namoradeira, a encontrar os primos. As idas ao cinema. E haja cine Centenário, São Jorge, Pedro II. Intenção: mais a de namorar que de assistir aos filmes. E as andanças pelas ruas até chegar aos cinemas, as mãos nas mãos, uns beijinhos que eu fingia ser roubados, e as estrelas me olhando, eu a olhá-las por sobre os ombros masculinos. Tão cúmplices eram elas! E, na USP, era a cidade bordada de luzes, lá do alto, coberta pelo céu magnífico. E o primo estudante de biologia a fazer pedido de casamento. Ele, já com 27 anos, eu, com 16. Uma emoção enorme, regada a estrelas. E eram os banhos de piscina, na casa da prima Rosarinha, o corpo inteiro que só, o deitar-me a contemplar nuvens, a esperança a meu dispor, um céu inteiro à minha disposição.
E era a mulher adulta, casada e com filhos, as visitas esporádicas, os tios velhinhos, os primos indo embora, ainda assim, o oásis do céu, a possibilidade de perder-se no belo, antes de retornar para São Paulo.
E era eu, mudando-me para cá, os filhos ainda pequenos. Promessas de sol. Afinal, eles mereciam. Eram as responsabilidades, as correrias. Mas era também o levantar-se a cada manhã e deparar-me, na City Ribeirão, com o verde das árvores, ouvir passarinhos e principalmente olhar o céu e seu esplendor. Bálsamos.
Agora, os filhos grandes, prestes a envelhecer, muito chão povoado de passos, muita luta empreendida, muitas das ilusões de outrora modificadas, esta paulistana definitivamente escolheu Ribe - é a forma carinhosa de chamar a cidade - que escolhi para morar e permanecer. A cidade modificada, como tudo: lei que não se mostra diferente para ninguém. Talvez menos paz e tranqüilidade. Tijolos a invadir os verdes. O que não muda mesmo é o céu. Imutável e lindo. Nas noites e nos dias. Céu de sol, céu de estrelas: presente ribeirãopretano com que foi agraciada a paulistana que eu sou.
Texto de Mariza Helena Ribeiro Facci Ruiz publicado no Guia Centro de Ribeirão - Edição Julho 08

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