terça-feira, 27 de outubro de 2009

ACERTAR-A-MOSCA

Era índio-moço/ambição e quis se tornar grande arqueiro. Busca/procura mestre-arqueiro, que lhe diz - primeira coisa é aprender não-bater-mais-cílios. Que a vida lhe seja farta/fértil, agradece, s´inclina/toca-peito, coração.

Por tres anos se exercita esse moço/homem. As pálpebras tinham se esquecido, já, do instintito/músculo de fechar-se, abertas até-mesmo-ao-dormir, quando agora-homem se apresenta, de novo, ao mestre. E, logo confirma - deve aprender a OLHAR; se conseguir ENXERGAR uma coisa minúscula, do tamanho de uma montanha, volte a-mim.

O homem amarra com fio-de-cabelo/mosca e se posta diante a fixar só/fixa/mente: ela. Passados tres dias era ainda a mosca. Porém, depois, tres semanas após, estava grande como borboleta/flor/gafanhoto. Final do terceiro ano, ele via a mosca tão-maior - um tapir. "Consegui", pensou o homem, (sentiu-se) iniciado.

Saiu/seguiu-caminho e as pessoas lhe pareciam árvores, as capivaras colinas, as antas serras. Assim treinou/esmerou muitobem seu olho que podia centrar qualquer alvo. Mais: acertar/colocar uma segunda flecha no término da primeira, uma terceira na extremidade da segunda, e daí-afora, até que entre o alvo e o arco se formasse uma linha-compacta de flechas enfiadas umasnasoutras. Ponto àquele chegado, pens-consciente, duvida... Para vir-a-ser o maior arqueiro, mestre-arqueiro-de-todos, deveria eliminar o próprio (seu) mestre/guia.

N´uma tarde, luz oblíqua tange/tinge, estando pelo prado/periferia da aldeia, notou o antigo mestre vindo em-para-si. Rapidíssimo, desperta/arco/levanta e o tomou na mira.

Percebendo (pré-sabendo) o movimento, por sua vez, o mestre empunha/embraça o arco para responder/revide.

Duelo-de-morte: a precisão do tiro é tal, de parte e outra, que as duas flechas se encontram no-meio da trajetória. NO AR. E caíram (ambas) por terra. "Como?" Somos tantos os grandes arqueiros, neste mundo!, e o (já) então grande arqueiro virá-a-saber de um mestre ainda-melhor que o primeiro. Velho/indio-iluminado. Santo/sábio/supremo, era O-perfeito.

Encontrá-lo em seu hermo/solidão, alto de um monte, é tarefa-que-pede tres anos, luas-contadas. Selva-rios-distância. Pacientespera. Sacrifício/vontade/certeza.

Se apresenta atirando n´uma revoada de pássaros espantandos/espalhados que revoam, atravessa/matando sete deles, única flecha, um tiro apenas. Aos-pés dos dois. O velho contempla sorrí. Generoso/generumano, compreende.

Voa/passa uma garçaltíssima, o mestre põe uma flecha invisível n´um arco também invisível/inexistente e a alcança/abate/derruba, inexorável chão. Espanto-de-clamar! Completa/comenta, língua de boca-que-não-fala/transmite: enquanto depender arco/flecha para atingir o alvo (e) usar olho para VER, não será preciso, nunca será arqueiro, na verdade nem será.

Age em-neste-tanto; com o dito, feito/findo. Deciso - seguro - o velho mestre assume de força das mãos do recém-chegado, o arco (ora não-jamais necessário) e o rompe/destrói, mandando pedaços quase-brutal ao precipício-não-vejo-fundo, lá, alma/âmago do mundo.

Indica mesmo gesto, completo O-sublime, lugar-único que ocupou/possuiu/serviu por tantas estações/gerações, quantas? E da vida se ausenta afastando-se/adentrando destinos misteriosos sagrados/segrêdos novos-novos da floresta. Natureza só com ele íntima, na razão de abrir passagem afastar galhos, índio-velho, imperioso/intima/ensina real-posto onde estivera sempre, longe dos homens para melhor entender sua poucamente fraqueza/banal angústia, a meditar/consolação (se há) nesta visão infinita de verde verde verde, águas grandes, gritos cantos urros, morte e vida. Putrefato nascimento: até o fim, até quando o próprio SOL, à espera dos-que-virão, um dia, quem sabe (êle mesmo), não comece a se apagar/envelhecer.

(Cine/conto-zen para Sebastião e Michelangelo) de Jirges Ristum

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